ALUNO
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O discipulado envolvia os trabalhos
diários e tarefas simples, e o trabalho de evangelização. Nesse artigo não
abordaremos as tarefas, daremos ênfase ao trabalho de evangelização, porém,
ressaltamos a grande importância disso, visto que a responsabilidade deve ser
desenvolvida no caráter do discípulo, e nada melhor do que tarefas práticas
para avaliar o desempenho e confiabilidade de cada um.
Asher
Intrater (INTRATER, 2016, p.21) mostra a necessidade do uso das tarefas no
discipulado e esclarece mais adequadamente o seu objetivo:
Discipulado é o processo de cultivar amigos
com potencial de ser confiáveis. O treinamento consiste de fazer uma série de
experiências com um discípulo, confiando-lhe tarefas práticas que crescem em
importância de acordo com seu desempenho anterior. Se for fiel numa determinada
área, está apto para responsabilidades maiores. Se é fiel no pouco, é provável
que seja fiel no muito. Um líder com potencial promissor deve primeiramente ser
responsável por uma pequena tarefa.
3.1. O trabalho de Evangelização.
A origem da formação do discipulado de
Jesus não consistiu, prioritariamente, na busca do saber pelo saber (como o
faziam grandes mestres da cultura grega), nem do poder baseado na hierarquia
(como o de certos líderes político-carismáticos). O que congregou um grupo em
torno de Jesus foi, provavelmente, o sonho de construir um outro tipo de
sociedade, na qual Deus é o senhor (Reino de Deus).
A
evangelização de Jesus estava associada a implantação do reino de Deus.
Quando ele disse para os discípulos
irem de dois em dois dando testemunho do reino, entrando nas casas, curando os
enfermos, ressuscitando os mortos eles deveriam dizer: É chegado a vós o reino
de Deus. Lucas 10:9.
O uso dos dons espirituais no trabalho
de Jesus com seus discípulos mostrava-se vital para que sua mensagem fosse
ouvida e o seu objetivo alcançado, pois eles estavam anunciando o Reino de Deus
e a sua evidência era a manifestação do poder de Deus através dos dons
espirituais.
Porém, o movimento de discipulado que
aconteceu na Argentina em meados da década de 80, atingindo o Brasil e
definindo seu conceito e sua aplicação, não trouxe consigo essa consciência,
tornando o discipulado mais um mentoreamento[1]
do que propriamente o que Jesus propunha. Os discipuladores viraram coachs[2]
e os discípulos foram ensinados a serem pessoas melhores. Jamê Nobre (Nobre, 2011) em seu artigo “Os Dons Espirituais e a Igreja”
ressalta esse aspecto faltante no discipulado:
Uma coisa aconteceu de forma surpreendente nesses
anos: formamos homens bons, profissionais dedicados, pais conscientes, famílias
exemplares, mas nos esquecemos do poder que geraria a graça para irmos aos
povos e isso nos fez esquecer das nações. O discipulado se tornou em algo
mental, baseado no convencimento de uma teologia aparentemente correta – digo
aparentemente correta, pois ela deveria ter os elementos que nos levam a buscar
uma excelência de caráter, mas esquecemos de que sem o poder do Espírito Santo
o que fizermos não tem fruto permanente. Formamos pessoas sem paixão, sem
compaixão, e sem a experiência dos dons espirituais para viver aquilo que
ensinávamos.
Sem o poder de Deus a mensagem do
Evangelho se torna refém de persuasão humana e o poder de convencimento de
oradores e apologetas[3]. Jamê Nobre (Nobre, 2011) acerca disso acrescenta que:
Temos desejado sair da ignorância dos dons. Temos
compreendido que os dons são as ferramentas de Deus para edificação da Igreja,
de cada discípulo. Nossa mente tem sido aberta pelo Senhor para compreendermos
que é impossível andar, construir, viver, sequer respirar sem o poder do
Espírito Santo. Como podemos edificar sem ferramentas? Sem o poder do Espírito
Santo, sem os dons espirituais, a nossa pregação se torna linguagem persuasiva
de sabedoria humana. Sem o espírito de profecia perdemos o testemunho de
Cristo! Considero os dons espirituais como os andaimes de uma construção. Sem
eles somente construímos até a nossa altura. Não conseguiremos levantar as
paredes mais além da nossa estatura. Se continuarmos colocando tijolos vamos
formar uma fortaleza e não uma casa.
Como poderemos formar nossos filhos sem a Graça
poderosa do Espírito Santo? Como poderemos discernir os espíritos sem os dons?
Como poderemos curar sem a graça dos dons? E expulsar demônios? E beber coisas
mortíferas? E ressuscitar mortos? E falar em novas línguas? Nesses últimos
tempos tenho visto um pouco daquilo que o Senhor quer.
Davi Lago (Lago, 2016) em seu artigo “Quando a Igreja não serve pra nada”
exorta que a Igreja que não se utiliza dos dons do Espírito estão se
aperfeiçoando na carne, visto desprezarem o poder de Deus. Isso se relaciona
perfeitamente com o discipulado:
Esse é um alerta urgente para a igreja hoje!
Precisamos de poder! Não podemos ser crentes-árvore-de-natal: enfeitados, mas
sem frutos. Não basta pregarmos sermões bem elaborados e intelectualmente
perfeitos. Do mesmo modo, não basta pregarmos mensagens emotivas e sentimentalistas.
Precisamos de poder! De nada vale empolgação sem transformação. De nada valem
eventos e shows sem compromisso com o discipulado. Aliás, vivemos numa cultura
cristã saturada de eventos. Como disse o pastor Simonton Araújo, o próprio
termo se condena: “evento”, “é vento”. Na verdade, muito do que a igreja faz
sob a imagem de evangelismo, não passa, afirmou o pastor Araújo, de “pesca
esportiva”. O evento fisga pessoas mas depois as solta tranquilamente para o
mundo.
Precisamos de poder. Precisamos perguntar hoje o
que o apóstolo Paulo questionou aos gálatas: “Será que vocês são tão insensatos
que, tendo começado pelo Espírito, querem agora se aperfeiçoar pelo esforço próprio?
” (Gálatas 3.3). Portanto, podemos questionar: Quando a Igreja não serve
para nada? Jesus mesmo disse aos seus discípulos no sermão do monte que o sal
insípido “não serve para nada”.
Davi Lago
(Lago, 2016) encerra o seu artigo dizendo que:
Devemos buscar com paixão o Espírito Santo de Deus.
Se não estivermos cheios de Deus não há como transbordamos! Sem enchimento não
há vazão. Conforme registrado em Mateus 17.20b, Jesus disse: “Eu lhes asseguro
que se vocês tiverem fé do tamanho de um grão de mostarda, poderão dizer a este
monte: ‘Vá daqui para lá’, e ele irá. Nada lhes será impossível”. Para a Igreja
cheia de poder, nada é impossível.
Por outro lado, Howard A. Snyder no seu livro “O
Problema dos Odres” (Snyder,
1986) enfatiza que não há nada mais prático do que ensinar as pessoas a
descobrirem e praticarem seus dons, visto que as ajuda a entenderem quem são e
como podem ser eficazes em seu testemunho e ministério:
Não há ensinamento mais prático do que na área dos
dons do Espírito. A descoberta do seu dom espiritual muitas vezes torna um
cristão frustrado e condenado em um discípulo feliz e eficaz. No meu próprio
caso, a descoberta dos dons esclareceu o ministério para o qual Deus tem me
chamado e abriu novas perspectivas de serviço. Quando identifiquei e nomeei
meus dons espirituais, foi como se todas as peças contraditórias de minha vida
de repente se encaixassem. Achei a chave do que Deus estava fazendo em e
através de mim um ministério feliz e eficaz deve ser resultado de identificação
e responsabilidade para com os dons que o Espírito nos tem dado. Pois é o
próprio Cristo que “dá dons aos homens” para que possam com alegria
glorificá-lo.
Conquanto alguns achem que os dons não são vitais
para o discipulado, Bill Johnson (Johnson, 2005) diz:
No Novo Testamento, esta promessa veio para todos
os crentes através da Grande Comissão. Ela torna-se vital quando Deus nos pede
para fazer algo que humanamente é impossível. É importante vermos isso. É a
presença de Deus que estabelece a ponte entre nós e o que é impossível. Costumo
dizer ao meu pessoal: "Ele está em mim para o meu bem, mas Ele está sobre
mim para o bem de vocês." Sua presença torna tudo possível! Deus não
precisa fazer experiências para realizar algo sobrenatural. Ele é sobrenatural.
Ele teria que fazê-las para não o ser. Se Ele é convidado para uma situação,
não devemos esperar nada menos que uma invasão sobrenatural.
Vemos que o reino de Deus deve ser feito da maneira
de Deus e com as ferramentas que Deus deixou. Se não utilizarmos o poder de
Deus dos dons, teremos que nos contentar com ferramentas humanas, mentais e
emocionais como terapias, conselhos, treinamentos, autoajuda, dinâmicas,
oratórias, luzes e shows.
De acordo com o que vimos, a maioria daquilo que se
faz e se denomina como discipulado hoje em dia tem pouco a ver com isso. O
problema é que anos a fio denominando discipulado em alguma que não é, acaba se
tornando, isto é, o conceito original é deturpado por causa da prática.
A palavra de Jesus confrontava o entendimento dos
religiosos da época e, parece, que também os da nossa época. E isso os leva a
questionar a prática com as escrituras. Bill Johnson (Johnson, 2005) fala sobre isso:
A história geral nos dá uma lição de um grande
líder militar. Alexandre, o Grande, liderou seus exércitos de vitória em
vitória, e o seu desejo por conquistas cada vez maiores finalmente o levou aos
pés do Himalaia. Ele queria ir para o outro lado daquelas montanhas desafiadoras.
Entretanto ninguém sabia o que os esperaria do outro lado. Seus oficiais
diretos perturbaram-se com essa nova visão do seu líder. Por quê? Eles tinham
ido até os limites do mapa, e não havia mapa algum para aquele novo território,
do outro lado, do qual Alexandre agora queria tomar posse. Aqueles oficiais
tiveram que tomar uma decisão: estariam dispostos a obedecer ao seu líder, indo
além dos limites do mapa conhecido, ou se satisfariam em ficar dentro desses
limites? Eles decidiram obedecer a Alexandre. Obedecer a direção do Espírito
Santo pode colocar-nos neste mesmo dilema. Conquanto Ele nunca contradiz a Sua
Palavra, o Espírito Se põe muito à vontade para contradizer o nosso
entendimento dela. Aqueles que se sentem seguros em virtude de sua abordagem
intelectual das Escrituras desfrutam de um falso senso de segurança.
Nenhum de nós tem um pleno entendimento das
Escrituras, mas todos temos o Espírito Santo. Ele é o nosso denominador comum,
que sempre nos conduzirá à verdade. Mas, para obedecer a Ele, precisamos estar
dispostos a sair dos nossos limites - temos que ir além do que conhecemos. Para
fazermos isso com sucesso, temos que reconhecer a Sua presença, acima de tudo.
Há uma grande diferença entre o modo de ministrar de Jesus e o modo usual de
como se ministra nos dias de hoje. O Senhor era completamente dependente do que
o Pai estava fazendo e dizendo. Ele demonstrou claramente esse seu estilo de
vida logo depois de ter sido batizado pelo Espírito Santo. Ele seguiu a
liderança do Espírito, mesmo quando parecia ser um procedimento irracional, o
que com frequência acontecia.
O discipulado proposto por Jesus tinha a
manifestação do poder de Deus como evidência de que o Reino de Deus tinha
chegado. Um discipulado que não ajuda as pessoas a descobrirem, desenvolverem e
exercitarem seus dons tem pouco a ver com o discipulado de Jesus, pois como
Paulo dizia: O reino de Deus não consiste em palavra, mas em poder. (I Cor.
4:20 NVI) ou como Bill Johnson (Johnson, 2005) disse:
Toda revelação da Palavra de Deus que não nos
conduza a um encontro com Deus somente serve para nos tornar mais religiosos. A
Igreja não pode permitir-se a ter "forma, mas sem poder", pois isso
gera cristãos sem um propósito.
A Metodologia do Discipulado
Jesus poderia escolher qualquer
metodologia para ensinar seus discípulos. Poderia ter utilizado o ensino
online, por correspondência, por livros, dando aulas em uma escola, enfim, ele
poderia escolher em qual data nascer e qual metodologia de ensino utilizar. Ele
escolheu viver cerca de 3 anos e meio com eles.
Jesus é o mestre dos mestres e também
decidiu utilizar, de forma brilhante diversas maneiras para se fazer entender e
explicar coisas sobrenaturais. Preleções e discursos foram utilizados por Ele
para anunciar o Evangelho para multidões. Os cinco discursos principais, baseados no evangelho de Mateus foram: Sermão da Montanha (capítulos 6, 7 e 8), Discurso da Missão (cap. 10), Discurso das Parábolas (cap. 13), Discurso sobre a Igreja (cap. 18) e o Discurso das Oliveiras (cap. 24).
Também se utilizou de objetos e coisas
do dia a dia – pão, sal, sol, cálice etc. Além da dramatização – quando trouxe
as crianças, quando lavou os pés dos discípulos. Histórias e parábolas – Aparecem
50 vezes no Novo testamento.
Também foi exímio ao
provocar as consciências através de perguntas, além de discussões e debates. Mauro
Nilo Schneider (2015) mostra algumas das muitas perguntas utilizadas por Jesus
aos seus diversos interlocutores. Aqui ressaltamos as direcionadas aos seus
discípulos:
Os discípulos: a estes Jesus fez muitas
perguntas. A dois discípulos de João Batista que passaram a segui-lo perguntou:
Que buscais? (João 1.38). Sobre sua identidade, Jesus, em outro momento
perguntou aos doze: Mas vós...quem dizeis que eu sou? (Mt 16.15). Depois de um
duro embate com os judeus, muitos seguidores o abandonaram, e diante do fato ele
os questiona: Porventura, quereis também vós outros retirar-vos? (João 6.67).
Quando Pedro começou a afundar no Mar da Galileia, Jesus o socorreu,
questionando-o: Homem de pequena fé, por que duvidaste? (Mt 14.31). Em outro
momento, diante da inércia dos discípulos que não sabiam lidar com um jovem
enfermo, Jesus exclama: Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei
convosco? Até quando vos sofrerei? (Mt 17.17). Ao Filipe disse: Filipe, há
tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? (João 14.9).
Ele encarnou, viveu, praticava
aquilo que ensinava. Os discípulos não somente podiam entender o que Jesus
fazia, mas também imitar seus procedimentos e atitudes. Eles ouviam o que Ele
ensinava, mas também conseguiam ver a expressão da sua face, o tom e a altura
da sua voz, a intensidade dos seus movimentos, tudo enquanto os fatos ocorriam
no contexto de fome, dor, preconceito, perseguição, conflito, sublimação,
angústia, alegria, tristeza etc. A frase célebre resume a força deste modo de
ensino, "Aquilo que você é fala tão alto que não posso ouvir o que você
diz." A melhor encadernação para os Evangelhos nunca foi qualquer que
fosse a capa de couro: e, sim, a pele humana.
J.M.Price
(Price, 1980 p. 7,8) diz sobre isso:
A encarnação da verdade pelo mestre afetava o
seu ensino pelo menos de duas maneiras. Em primeiro lugar, dava-lhe um tom de
autoridade que se não via nos escribas e rabinos do seu tempo — os professores
oficiais dos dias de Jesus. A sabedoria destes era mais aquela vinda de fora,
era matéria de oitiva, ensinavam mais citando autoridades e a tradição. A
sabedoria de Jesus vinha de dentro e não precisava de escoras ou de
confirmação. "Este mestre era
diferente. Não citava ninguém, e
apresentava sua própria palavra como suficiente." Portanto, ensinava com
clareza meridiana, com convicção e poder. O povo "se admirava do seu
ensino, porque ele os ensinava como quem tinha autoridade, e não como os
escribas" (Mar.1:22). O fato de viver aquilo que ensinava também inspirava
confiança naquilo que dizia. O povo viu corporificado no que ele praticava
aquilo que ele queria que eles fizessem. Anotavam como ele se comportava diante
da tristeza, da crítica, do desapontamento, da perseguição. O seu modo de viver
reforçava e dava peso àquilo que dizia. "A maior coisa que seus discípulos
aprenderam de seus ensinos não foi a doutrina, e, sim, sua influência. Até a
última hora de suas vidas, a maior coisa foi o terem eles estado com
Jesus." Por isso, "designou doze para estarem com ele" (Mar.3:14).
Como mestres humanos podemos demonstrar em nossa vida "o delineamento do
Cristo que mora em nós". Somente assim podemos estar na altura deste
primeiro teste de habilitação ou idoneidade.
Concorda
com isso Keith Phillips (2008, p. 20) quando definiu:
O discipulado cristão é um relacionamento de
mestre e aluno baseado no modelo de Cristo e seus discípulos, no qual o mestre
reproduz tão bem no aluno a plenitude da vida que tem em Cristo que o aluno é
capaz de treinar outros para que ensinem outros.
Esse relacionamento tão perto de quase
três anos foi essencial para imprimir neles muito mais do que ensino. Além de
ensinar o que fazer com o poder que eles tinham recebido, Jesus queria que eles
tivessem a motivação certa: o amor.
[1]
Mentorear é o processo de transmissão de bagagem de conhecimentos e
experiências a pupilos, no sentido de sua orientação, da facilitação do seu
auto-descobrimento e do aperfeiçoamento de suas potencialidades de liderança.
Nesse processo, o mentor não dita regras e informações, mas permite que outros
o conheçam e ao mesmo tempo se revelem nas fraquezas onde desejam se
fortalecer.
[2]
Coach é uma palavra em inglês que significa treinador, instrutor e pode
também ser um tipo de ônibus. Em inglês, quando usada como verbo, a
palavra coach significa treinar ou ensinar. Além disso,
um coach ou coacher é um profissional que exerce o coaching, uma
ferramenta de desenvolvimento pessoal e profissional.
[3]
Apologeta é aquele que tem por fim defender a religião cristã.
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